sábado, 9 de abril de 2011

O ABORTO - POR RONALD DWORKIN

            Ronald Dworkin é um filósofo do Direito norte-americano e, atualmente, é professor de Teoria Geral do Direito na University College London e na New York University School of Law. Estudou na Universidade Harvard e no Magdalen College da Universidade Oxford, onde era aluno de Rupert Cross e um Rhodes Scholar. Depois, estudou na Harvard Law School e, posteriormente, atuou como assistente do renomado juiz Learned Hand da Corte de Apelo dos Estados Unidos. Em 1969, Dworkin foi indicado para a Cadeira de Teoria Geral do Direito em Oxford como sucessor de H.L.A. Hart. Depois de se aposentar de Oxford, Dworkin assumiu a cátedra Quain de Filosofia do direito em University College London, assumindo, em seguida, a cátedra Bentham de Teoria do direito, uma posição que ainda mantém.
            Estou terminando a leitura do livro "O domínio da vida", que Dworkin escreveu em 1993. Na obra, o autor reflete sobre algumas questões de grande discussão e contradição na sociedade ocidental mundial, tais como, aborto, eutanásia e tratamento da velhice. O livro, em si, é rico em abstrações e exemplos filosóficos que explicam as opiniões de Dworkin. Durante as explanações, o autor evita referenciar teorias filosóficas de certa complexidade, preferindo, em contraparida, oferecer exemplos que esclareçam o leitor sobre as diferentes formas de pensamento filosófico sobre os assuntos tratados.
            Em linhas gerais, procurarei sintetizar a opinião de Dowrkin sobre o aborto. Acredito que a leitura completa do livro continue sendo indispensável para qualquer acadêmico de direito, principalmente aos que desejam entender o ordenamento jurídico, e não apenas aplicá-lo.
             Além disso, é necessário salientar que a pesquisa se atém, principalmente, ao seguinte aspecto: Deve o Estado interferir nas decisões particulares e, assim, proibir o aborto por meio de previsão legal penal?
             Para discutir tal questão, o autor elenca dois modos de pensamento que podem basear a justificativa da proibição do aborto, ambos presentes na sociedade ocidental, sendo eles, o modo de pensamento "derivativo" e o  "independente".
            Aquelas pessoas que defendem a proibição do aborto de acordo com o pensamento "derivativo" entendem que o feto, desde a concepção, é um sujeito com direitos individuais e, dessa forma, ninguém poderia retirar do feto o seu direito à vida. Aliás, o Estado teria o dever de proteger os direitos do feto, inclusive contra os interesses da mãe, até mesmo em casos de anencefalia fetal.
            Em contrapartida, as pessoas que defendem a proibição do aborto nos termos do modo de pensamento "independente", acreditam que a vida tem um valor sagrado, algo que, de certa forma, é respeitado desde os primórdios da humanidade e que, sem sombras de dúvidas, deveria ser mantido como condição da manutenção da equação existente entre humanidade e natureza. 
            Para assombro daqueles que lêem Dworkin, o autor consegue demonstrar por que a maioria das pessoas pensam da forma "independente", e não da "derivativa". Particularmente, sempre acreditei que a maioria das pessoas que defendiam a proibição do aborto o fizessem porque acreditavam que o feto tinha direito à vida, mas, definitivamente, depois de ler Dworkin, mudei de opinião e, hoje, depois de ler as pesquisas que o autor apresenta, bem como suas conclusões lógico-filosóficas, realmente observo que as pessoas são adeptas ao pensamento "independente", ainda que não percebam.
             De qualquer modo, um dos fatos mais interessantes da obra de Dorkin se apresenta quando o autor explica o motivo  que, independentemente  da forma de pensamento que o Estado justifique a proibição do aborto, ambas são inválidas. Ou seja, as leis que proibem o aborto, na maioria dos países ocidentais (inclusive o Brasil) não tem justificativa satisfatória em nenhuma das formas de pensamento e devem ser invalidadas.
             Assim, a proibição do aborto no Brasil, por exemplo, se tomasse como justificativa o modo de pensamento "derivativo" encontraria óbice gigantesco na liberação do aborto em casos de gravidez resultante de estupro. Nesse contexto, parece óbvio que nossa lei não se enquadra ao referido tipo de pensamento, até porque, se assim fosse, estaria admitindo que o direito da mãe de não conceber seu filho unicamente porque foi gerado por estupro é maior do que o direito à vida do feto, uma completa incongruência. O direito à vida do feto, no pensamento "derivativo" é supremo, havendo, inclusive, contradição  na decisão de aborto nos casos de risco de vida da mãe, visto que, não há como valorar se a vida da mãe é tão mais importante que a do filho, afinal, em alguns casos de risco, o feto sobrevive e a mãe não. 
             De outro lado, se a lei brasileira de proibição do aborto fosse justificada pelo modo de pensamento "independente", esbarraria na garantia constitucional de liberdade religiosa. Questiona-se, assim, como um Estado, que se diz "laico", poderá proibir alguma atitude de seus cidadãos considerando uma justificativa baseada em fundamento religioso? Há flagrante conflito nesta pretensão e o Estado, por conclusão óbvia, não poderá influenciar as escolhas de seus cidadãos com base em justificativas  de cunho "sagrado". Haveria verdadeira queda do direito de liberdade religiosa constitucionalmente assegurado.
           Independentemente de nossa opinião sobre o assunto (o presente texto apenas busca sintetizar a opinião de Dworkin - em forma simples e reduzida, para acadêmicos), é importante conhecermos os dois "lados da moeda". Sopesando argumentos, poderemos melhor desenvolver nossas impressões sobre tais hipóteses. 
         

Lucas 

5 comentários:

ABC do Direito disse...

Caro Lucas,

Parabéns pelo belo texto, bem claro e direto ao ponto.

Eu sou a favor do aborto. Concordo que as justificativas para a não liberação do aborto são bastantes contraditórias.

A corrente adotada aqui no Brasil parte do prisma "independete". O Brasil é um Estado laico, porém ele é teocrático, deixando-se levar por dogmas religiosos.

Outro questionamento a ser feito que é contraditório ao posicionamento da proibição do aborto é o uso da pílula do dia seguinte.

Quanto a previsão do tempo, aqui em Salvador está um tempo nublado com previsão de pancadas de chuvas. Brincadeiras a parte, ainda acho melhor procurarmos saber da previsão do tempo - pois é útil para nos precavermos e evitarmos surpresas desagradáveis - que conversármos sobre BBB, A fazenda, etc.

Texto bastante elucidativo e fiel aos ensinamentos deste mestre que é Dworkin.

Um forte abraço,

Ronaldo Pereira Borges
Equipe ABC do Direito

Leandro disse...

porque não tem mais atualização??
vai dizer que tá ocupado com a faculdade...
hehehehehe
abraço

Leandro

ABC do Direito disse...

Caro amigo,

Obrigado pelo reconhecimento do nosso trabalho. Será uma honra ter o ABC do Direito vinculado a este espaço de discussão acadêmica.

Um forte abraço,

Ronaldo Pereira Borges
Equipe ABC do Direito

Henrique G. disse...

Olá Lucas,

Encontrei esse blog através de uma comunidade do Orkut e resolvi dar uma olhada. Gostei muito do texto, achei bem estruturado e claro também.

Este assunto é bastante delicado para se tratar, principalmente quando é para se discutir com alguém, ou (como é o caso) publicar online.

É bom que nós venhamos a ler mais sobre o aborto não somente com a visão moral e social, mas também com a visão científica (conceitos médicos, psicológicos, etc.) e com a jurídica também (que é a que mais nos interessa).

Enfim, todo esse conhecimento nos ajuda a definitivamente defender um lado (se é que é possível) e ter fundamentação suficiente para sustentá-lo.
Parabéns pelo blog!

Abraço,

Mattheus Ferreira

Anônimo disse...

Dae Lucas

Gostei do texto, pena que não li ainda essa obra de Dworkin para poder ter uma análise mais crítica. Mas pelo o que li o que tu escreveste, fica claro como um posicionamente de um intelectual é interessante, pois consegui transmitir as diferanças conceituais, psicológicas e de cunho social no âmbito de uma análise axiológica do Direito. Essa amplitude de conhecimento conseguimos com as leituras e análise de textos como este, onde o propósito é mostrar a diferenças de pensamento e aceitá-las para compreendermos as inúmeras formas de pensamento, onde aceitando as diferenças é que chegaremos perto de uma melhor tolerância social.

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